13.10.08

II – Os limites do texto

II – Os limites do texto

Missão dos Doze Lc 9, 1-6
1Tendo convocado os Doze, deu-lhes poder e autoridade sobre todos os demónios e para curarem doenças. 2Depois, enviou-os a proclamar o Reino de Deus e a curar os doentes, 3e disse-lhes: «Nada leveis para o caminho: nem cajado, nem alforge, nem pão, nem dinheiro; nem tenhais duas túnicas. 4Em qualquer casa em que entrardes, ficai lá até ao vosso regresso. 5Quanto aos que vos não receberem, saí dessa cidade e sacudi o pó dos vossos pés, para servir de testemunho contra eles.» 6Eles puseram-se a caminho e foram de aldeia em aldeia, anunciando a Boa-Nova e realizando curas por toda a parte.

Este micro relato encontra-se bem delimitado quer pela maneira como é introduzido, quer pela diferenciação bem visível da acção que lhe antecede e que a segue. No versículo 1, não há uma referência temporal, mas percebe-se que o episódio acontece posteriormente ao episódio anterior da ressurreição da filha de Jairo, onde estavam presentes na cena mais pessoas do que agora parecem estar, já que Jesus reúne a si apenas os discípulos. Não há, de igual forma, um aspecto espacial a indicar a mudança de relato, mas percebe-se que Jesus para convocar os discípulos, não teria escolhido um espaço tão concorrido como aquele em que se dera a ressurreição da filha de Jairo. A mudança de personagens é o critério mais elucidativo neste sentido. De facto, é dito claramente, que na casa de Jairo, Jesus apenas se faz acompanhar por Pedro, Tiago e João, bem como dos pais da menina que também presenciam a cena. No relato seguinte, Jesus está a sós com todos os discípulos, não já apenas os três que o tinham acompanhado. O tema varia também de forma clara, pois passamos duma atitude de Jesus para uma cena onde o próprio Jesus concede poder e envia, com as suas palavras, os seus discípulos numa missão. O género literário só vem confirmar esta separação entre os relatos, pois assistimos a um milagre, para depois encontrarmos um discurso de Jesus, comunicado pelas suas próprias palavras. A partir do versículo 7, vemos uma mudança de figura, que passa de Jesus para o tetrarca Herodes, o que deixa antever a separação que ocorre no inicio deste novo micro-relato.
Neste micro relato, de maneira a podermos ter uma sequência lógica, podemos apontar 3 quadros ou 3 chavões, se assim quisermos dizer.
1 – A convocação dos discípulos, onde o narrador faz um sumário do que se vai passar, de tal maneira, que o que é dito a seguir, não é já novidade, apenas se encontra mais desenvolvido
2 – As palavras de Jesus no discurso directo, onde se refere as próprias palavras com que Jesus exortou os discípulos (“Nada leveis para o caminho: nem cajado, nem alforge, nem pão, nem dinheiro; nem tenhais duas túnicas. 4Em qualquer casa em que entrardes, ficai lá até ao vosso regresso. 5Quanto aos que vos não receberem, saí dessa cidade e sacudi o pó dos vossos pés, para servir de testemunho contra eles”)
3 – A resposta dos discípulos, não por palavras, mas por obras concretas (“6Eles puseram-se a caminho e foram de aldeia em aldeia…)

Por outro lado, este micro relato insere-se numa sequência narrativa, se atendermos ao seguinte: trata-se duma perícope de transição, em que antes dela, vemos relatos de Jesus nos seus gestos (milagres, parábolas, diálogos explicativos aos seus discípulos), mas aqui começamos a assistir à acção dos discípulos depois do mandato de Jesus, bem como o dinamismo de acontecimentos que daí brotam. Tanto que neste capítulo 9 de Lucas, que começa exactamente com o envio dos discípulos, é-nos relatada a experiência dos discípulos, as suas reacções e até a própria profissão de fé de Pedro, que acaba por ser preparada pelo acto missionário que lhe é incumbido. Há por isso, uma unidade que dá corpo a este capítulo 9 de Lucas, que começa aliás por um aparente maior relevo dado aos discípulos, do que propriamente a Jesus, para depois Jesus introduzir os primeiros traços da sua missão que culminará na cruz. E isso vê-se nos anúncios da paixão que Jesus lhes comunica, nas condições necessárias para O seguir e até na discussão acerca de qual deles era o maior. O tema da paixão é pois o elemento presente em toda esta sequência narrativa.

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